sábado, 20 de setembro de 2008

Perdão


Verdades são tuas, as do coração,

E que mentiras soam aos outros!

Dedilham cruas cordas de fulgor,

Fúrias essas só em ti criadas,

Fúrias essas só em ti domadas,

Em veias palpitantes da razão.

Mas de perdão inunda-se o amor,

Flor que desabrocha utopias

De belezas inominadas!

Clemência santa de criança,

É essa a Deusa nossa,

É essa que perdoa e ama!

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Era uma vez...



Era assim uma vez
Era segredo era guardado
Que bela insensatez
Que destino que fado…

Era anjo demoníaco
Era donzela era o mal
Era engano aflito
De entendimento mortal

Que inconsciente dardeja
Que resvala que perdura
Que sem riso peleja
Cruel desventura.

Era verdade escondida
Era isso (era mais!)
Era sanidade perdida
Em sopros vendavais

Que enaltece a loucura
Que ama que odeia
Que vence em bravura
E em coragem estonteia.

Era adaga assassina
Era chaga era dor
Era trindade divina
E um pouco de amor

Que vence lutando
Que conquista que... tudo
Que respira rezando
Aos céus de veludo.

Era uma vez um dia
Era noite era luar
Era uma vez a magia
Do Reino do Ar

Que navega cantando
Que desatina que abraça
Que dorme sonhando
Ao som da barcaça.

Era uma vez uma Era
Era que é Era que vê
Que por Ser prospera
Que era aquilo que crê.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Saber



Dizes que não sabes,
Hesitas por estranhar,
O que um dia conheci,
No relembrar do olhar.

De uma delicada ave,
O cantar do rouxinol;
De uma obscura candura,
O pintar do luar;
Da ancestral estrela diurna,
O dançar do pôr-do-sol;
De eras memoráveis.
A escrita milenar.

Prosa e poesia,
São insanos milagres
As dádivas da sabedoria,
Versáteis, hereges,
Curiosos em demasia,
Meus, teus, nossos,
Fecundos na eternidade
Do renascer a cada dia.

Sente-se na ingénua criança,
Vê-se no antigo ancião,
Da efemeridade de uma flor campestre,
À imortalidade de um deus pagão.
Em Atenas reflectidos
O saber e perigos louvados,
Em guerras épicas, vãs,
Aos credos renegados.

Encanto assombroso, dir-me-ás,
Encanto grandioso, dir-te-ei.
Vozes, cantares surreais,
Em musas, ninfas, sereias;
Mitos, lendas reais,
Que a sabedoria divina
Veneram em águas pousadas
De belas sagradas Nereidas.

Dizes então que não sabes,
Muito mais queres saber,
No relembrar do olhar,
De um sopro do Ser.

domingo, 7 de setembro de 2008

Insatisfação



O dia nasce negro
E o coração escurece
Perdendo-se no erro
De que a alma padece.

Espero e nada vejo…
Caminho e nada encontro!
Quem vê invejo,
Quem encontra desencontro.

Suplico e reclamo,
Devolvo o abandono.
Diabólico é o engano
E o abandono assombroso.

Digo-me insatisfeito
Quero infinitamente mais:
A revolta do defeito,
As lágrimas que chorais.

Lamento por não as ter,
Lamento por desconfiar.
Nada mais pode haver
Que a mim possas entregar.

O que és não interessa,
Não o quero saber!
Mas minha alma inquieta
O teu espírito quer ter.

Nada que dizes é vão.
Vejo o mundo no olhar,
Vejo no teu coração
O inocente sonhar.

Pois és tudo o que há,
O sensível sorrir,
És a vida que dá
Ao coração que sentir.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Raios de Sol


Por entre céus de cinza,

Escapam almejados alumiares.

Sorriem à esperança, deusa santa,

Acenam à alegria que encanta,

Suas lembranças e pensares.

E são divinos, seus amores,

Embalo onde por fim acordastes:

Dançavam frescos de esplendores,

Em brumas subtis que sonhastes.

Por isso, silêncio à voz tremida.

Não temais valente horizonte,

Pois eles bailam pela vida.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Contradição


Olha, não olhes, não voltes a olhar.
Sempre o mesmo que espreita escondido,
Cintando o nariz à cara na falta de ar
Complexada do vidro da janela partido,
Esburacado, com calhas de vales abertos.

Vergonhoso!
Vergonha na vontade de voltar
Aos verdes vales abertos da janela
Dessa corrente de ar e ver…
Ver que se espelham montanhas,
Torres que tocam no céu do mar
Num delicado, enternecido beijar
De ceda feita a cetim
Mergulhado no ouro ornamentado,
Rico, rugoso rubi afogueado
Da face de um jasmim.

Chega! Recua!
Não consumas o paradoxo do sonho!
Não te risques da vida,
Não te obliteres da morte.
Não queiras ser um Deus morto
Nem em morto queiras ser um Deus,
Pois não o serás, mesmo que a imortalidade te mate
E te erga da morte neste sonho vivo.
Não terás jasmins,
Não terás torres que toquem no mar do céu ou no céu do mar,
Não terás nada, nada terás.

Cansas-me…
Não persistas mais e vai.
Deixa a janela, o vidro, o espelho,
O reflexo, a verdade, a mentira, o que for.
Nem tentes compreender que a compreensão é divina,
E tu Deus não és, ninguém o é,
Todos o somos e tu não és todos.

Tomando em consideração sem fim teorias,
Peço-te, imploro-te! Ordeno-te!
Vai… Não! Volta!
Não sei já o que digo. Confundes-me
Ao tentar nadar nesse riacho navegante,
Submerso na verdade mentirosa,
Romeira antiga.

Se o Sol se põe na morte,
Se nasce na vida destinada a morrer,
O que faço aqui contigo? Espero o final?
Recuso-me, assim como recusaste ir.
Bom-dia para ti, boa-noite para ninguém,
E que ninguém seja a vida.
A vida depois da morte?
A vida depois da vida!
Grandiosa, bela, imortal na imortalidade.
Nasce por nascer,
Nasce por viver,
Nasce por nascer e viver.
Brinca no arco-íris da vida,
Do claro ao escuro e do escuro ao claro.
Sê criança. Sorri, chora, faz chover.

Harpas, violinos,
Cordas que embalam o medo de morrer,
Embalem-no até ao sono eterno
Porque nós queremos viver!
Conhecer o fogo que gela
E o gelo que queima,
Ver os anjos que se dizem demónios
E os demónios que se dizem anjos,
Queremos o tudo que parece nada na insignificância,
Queremos o sonho surreal da realidade,
Queremos algo.

Destabilizado,
O bater de um coração parado que reanima,
Doce, seguro, extasiado,
Encantado junto a todo o corpo,
Em harmonia com o ser,
Com a mente afadigada.

Estilhaça a janela que te entrava,
Enigma reflectido nas asas do tempo.
Dá-me a mão e voemos!
Percamo-nos nessas montanhas de vales verdes
Com jasmins de vidro rubro.
Percamo-nos no céu do mar,
Nas torres infinitas.
Percamo-nos num mundo finito sem fim
Onde não há morte, nem o fado maldito
Que se reflecte em mim.

Ó antiga donzela invisível,
Princesa temporal do tempo incontestável,
Hei-me aqui, servo, Deus, algo mais,
Se algo mais houver para servir.
Ó sonho sonhado em suspiros
No recobro da vida por ti!

Só a ti sou fiel,
Só a ti, borboleta pálida verde em mim.
Verde da natureza, verde de esperança,
Ver de verde, vale verde,
Cansaço da alegre vida onde por fim morri.